O que é galicismo na língua portuguesa?

25.07.2025

Letras coloridas para ilustrar o processo de galicismo

Você já ouviu falar em galicismo? O termo se refere a estrangeirismos vindos do francês que foram incorporados ao português, principalmente em razão da influência histórica e cultural da França sobre o Brasil – influência esta que, como veremos, tem raízes profundas, mas também críticas importantes a serem feitas.

A influência do francês no português do Brasil

A entrada de galicismos no português está ligada à hegemonia cultural da França nos séculos XVIII e XIX. Durante esse período, o país era visto como um centro mundial de “civilização”, arte, moda e ciência – um imaginário construído por e para a Europa, e que acabou sendo amplamente replicado por elites coloniais e pós-coloniais em várias partes do mundo, incluindo o Brasil.

Durante o Império (1822–1889), a França passou a exercer forte influência sobre os costumes da elite brasileira. O francês era a língua das cortes e dos eventos sociais, sendo sinônimo de sofisticação – muitas vezes em detrimento das culturas locais e indígenas, e em oposição ao português – ainda que também língua do colonizador – que havia sido imposto e já era  falado pelas camadas populares. Esse padrão de imitação da cultura europeia se estendeu ao longo do século XX, especialmente nas elites urbanas do Rio de Janeiro e São Paulo, com destaque para a arte, a educação e os modos de consumo.

Contudo, para além da adoção elitista e eurocentrada do francês como símbolo de “bom gosto” e sofisticação, especialmente entre as elites brasileiras dos séculos XIX e XX, é importante reconhecer que a presença da língua francesa no Brasil também ocorreu por meio de outras vias, como intercâmbios culturais, diplomáticos e, em menor escala, migrações.

Embora a imigração francesa tenha existido no Brasil – especialmente no século XIX, com presença em estados como Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul – ela foi numericamente pequena em comparação com outras nacionalidades (como italianos, alemães e japoneses). Já a presença de pessoas oriundas de países africanos francófonos e do Caribe se dá de forma mais significativa no século XXI, especialmente no contexto contemporâneo de refúgio e migração forçada, com destaque para haitianos, congoleses e senegaleses.

Portanto, quando falamos sobre galicismos, estamos sim nos referindo à influência histórica da França como potência colonial e cultural, mas também podemos – e devemos – ampliar esse olhar para reconhecer que a língua francesa hoje carrega sentidos diversos, vivos e plurais. Povos do Sul Global que falam francês a partir de suas próprias experiências e resistências ressignificam a língua, contribuindo para sua riqueza e diversidade cultural.

Palavras de origem francesa no nosso dia a dia

Com o tempo, diversos termos franceses foram absorvidos pelo vocabulário cotidiano brasileiro. Alguns deles seguem com forte marca de “sofisticação”, enquanto outros já foram tão incorporados que nem percebemos sua origem. Confira alguns exemplos, organizados por áreas:

Gastronomia

  • Baguete (do francês baguette) – tipo de pão alongado e crocante.
  • Crepe (do francês crêpe) – panqueca fina e leve.
  • Crocante (do francês croquant) – que tem uma textura crocante.
  • Maionese (do francês mayonnaise) – molho feito à base de gema de ovo e óleo.
  • Ratatouille (do francês ratatouille) – prato provençal à base de legumes.
  • Suflê (do francês soufflé) – prato leve, geralmente de ovos, que cresce ao ser assado.
  • Patê (do francês pâté) – pasta feita com carne ou fígado, geralmente servida como aperitivo.

Objetos

  • Bicicleta (do francês bicyclette) – veículo de duas rodas movido por pedais.
  • Bolero (do francês boléro) – tipo de jaqueta curta, normalmente usada por mulheres.
  • Chapéu (do francês chapeau) – acessório de vestuário para a cabeça.
  • Carteira (do francês carte – carteira de dinheiro, documentos) – item para guardar dinheiro e documentos.
  • Penteado (do francês coiffure) – forma de arrumar o cabelo.
  • Vitrine (do francês vitrine) – exibição de produtos em uma loja.

Lugares

  • Café (do francês café) – local onde se serve café e outros alimentos.
  • Château (do francês château) – castelo, geralmente na região da França.
  • Bistrô (do francês bistro) – pequeno restaurante típico francês.
  • Hotel (do francês hôtel) – estabelecimento de hospedagem.
  • Ressentir (do francês ressentir) – experimentar emoções ou reações psicológicas em um lugar específico.

Moda e Estilo

  • Terno (do francês tissu para tecido e habit para vestuário) – conjunto formal de roupas.
  • Tailleur (do francês tailleur) – conjunto feminino de saia e blazer.
  • Chique (do francês chic) – pessoa ou estilo refinado e elegante.
  • Robe (do francês robe) – vestido ou roupa de dormir.
  • Boné (do francês bonnet) – tipo de chapéu com abas.

Artes e Entretenimento

  • Ballet (do francês ballet) – forma de dança clássica.
  • Clichê (do francês cliché) – expressão ou situação repetida até perder seu impacto original.
  • Comédie (do francês comédie) – peça teatral ou filme cômico.
  • Théâtre (do francês théâtre) – teatro.

Tecnologia e Comunicação

  • Clique (do francês clic) – ação de pressionar um botão do mouse.
  • Défaut (do francês défaut) – erro, falha, especialmente em contexto técnico.
  • Wifi (do francês Wi-Fi) – tecnologia de comunicação sem fio.

O francês além da França

Quando pensamos em francês, é comum associar a língua diretamente à França. Mas isso é um reflexo de um olhar eurocêntrico. O francês é também língua oficial – muitas vezes imposta por colonizações violentas – em diversos países da África, Caribe e Ásia.

Senegal, Benim, República Democrática do Congo, Haiti, Guadalupe, Vietnã, entre outros, falam francês e expressam culturas potentes, ricas e plurais, que não se limitam ao padrão europeu. Ao valorizar essas culturas, reconhecemos não apenas sua força de resistência, mas também seu protagonismo na reinvenção do idioma francês com sotaques, ritmos, expressões e referências próprias.

Por isso, ao estudar francês, é essencial refletir: quero limitar minhas referências culturais ou ampliá-las?

Aprender francês com os pés no Sul

Na Abraço Cultural, os cursos de francês vão muito além da gramática ou da “boa pronúncia” parisiense. Aqui, você aprende com quem vive o idioma e o transforma: refugiados e imigrantes de países francófonos do Sul Global, como o Congo, Haiti, Senegal e Camarões.

É uma oportunidade de se conectar a visões diversas do mundo, decolonizar o olhar e valorizar conhecimentos que historicamente foram marginalizados.

Aprender francês pode ser, também, um ato político de valorização de saberes periféricos e de resistência cultural.

Vem ampliar seus horizontes com a gente. Vem pra Abraço!


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